Quando sabe-se menos.

A partir do momento em que a significação surge nas palavras de um texto, na exata precisão de ideia, nasce a sabedoria. A leitura, a elucidação e a compreensão provocam a emancipação da sabedoria alheia. Trata-se então da sabedoria íntima que se subtrai, uma concepção pessoal que acaba de ser preenchida por outro, uma possibilidade de vislumbre inédito que se anula, desaparece. Então, quando isso ocorre, estamos a saber menos do que o nosso egoísmo idealizou.



terça-feira, 17 de maio de 2011

Solidão

Despertou decentemente.
Apenas o silêncio vinha lhe fazer companhia. Percorreu os olhos num possível e nada encontrou, era a paz de uma manhã almejada.
Caminhou do quarto até a sala, e dali até a porta de entrada. Abriu a porta e não viu ninguém, era a certeza de da própria condição.
Retornou à sala e logo começou a escrever. De imediato percebeu que o ócio criativo requer silêncio, o silêncio de palavras para preenchê-lo, estabelecendo assim o fim do silêncio e do ócio criativo por palavras moldadas.
Queria conclusões, das absurdas às abstratas.
Por horas divagou e por poucas escreveu. Por vezes buscava uma palavra, por outras apenas inventava. Não havia controle ou qualquer tipo de objeção.
Pensou, entendeu, acreditou, estabeleceu, resolveu, sintetizou e se perguntou.
Seguiu seu raciocínio até não mais raciocinar.

Os dias passaram e a leve feição de alegria, vista na primeira manhã, não mais se notava.
Dentro de casa se sentia sufocado. Necessitava de um pouco de ar fresco, descontaminado. Saiu em passos largos e desenfreados rua afora, nada o impedia.
Chegou ao mais longe permitido para perceber que fugia dele, de suas idéias, certezas e sentidos. Não suportava sua própria companhia.
Voltou pra casa sem saber por quais próprios motivos, mas com esperança de desabafar. Abriu a porta e não havia ninguém.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Sobre o medo da morte

Não há maior temor que o do inevitável, maior desprazer que o da insuficiência de tempo, maior incapacidade que a da distância, maior presença que a da falta.
Morrer: [Do latim vulgar morrere, por mori] Verbo intransitivo.
Perder a vida; falecer, finar-se, morrer-se, expirar, perecer. Abotoar o paletó, adormecer no Senhor, apagar, apitar, assentar o cabelo, bafuntar, bater a alcatra na terra ingrata, bater a caçoleta, bater a canastra, bater a pacuera, bater as botas, bater com a cola na cerca, bater o cambito, bater o pacau, bater o prego, bater o trinta-e-um-de-roda, botar o bloco na rua, cessar de viver, comer capim pela raiz, dar a alma ao Criador, dar à casca, dar a lonca, dar a ossada, dar com o rabo na cerca, dar o couro às varas, dar o último alento, defuntar, desaperecer, descansar, descer à cova, descer a terra, descer ao túmulo, desencarnar, desinfetar o beco, desviver, dizer adeus ao mundo, embarcar deste mundo para um melhor, empacotar, entregar a alma ao Diabo, entregar a rapadura, espichar, esticar a canela, esticar o pernil, estuporar-se, expirar, fechar os olhos, fenecer, ir para a cidade dos pés juntos, ir para a Cucuia, ir para bom lugar, ir para o Acre, ir para o beleléu, ir para o outro mundo, ir-se desta para melhor, largar a casca, padecer, passar a tira, render o espírito, vestir o paletó de madeira, virar presunto.
Não há pior morte que a do outro.

terça-feira, 10 de maio de 2011

quinta-feira, 5 de maio de 2011

Lúcidos sonhos de uma noite sem sono.

Por dias seguidos não dormia. Sentia pulsar seus pensamentos, na noite, na cama que lhe acolhia em profunda solidão. Almejava as estrelas como teto, como um lar adoradamente distante. Sentia a noite aberta como agora o peito.
Atordoado por sua própria significação, pensava nas escolhas, as suas, as de outrem e as em comum.
Deitado, parecia eternamente partido, ficava a notar os fatos conjugados num tempo passado e se esquecia.
Queria um novo dia desvinculado de outros dias.
As horas pelas horas se arrastavam, a angústia se multiplicava em bom grado e sua feição se desfacelava em tristeza permitida, no escuro.
Quando em quando se sentia cansado e lamentava. Não entendia como podia não dormir um homem tranquilo.
Seu mal era a consciência.
Ao mal ele consentia.