Quando sabe-se menos.

A partir do momento em que a significação surge nas palavras de um texto, na exata precisão de ideia, nasce a sabedoria. A leitura, a elucidação e a compreensão provocam a emancipação da sabedoria alheia. Trata-se então da sabedoria íntima que se subtrai, uma concepção pessoal que acaba de ser preenchida por outro, uma possibilidade de vislumbre inédito que se anula, desaparece. Então, quando isso ocorre, estamos a saber menos do que o nosso egoísmo idealizou.



terça-feira, 26 de julho de 2011

Modus vivendi

Meu pai é sonâmbulo
e gosta de ficar nu.

Nunca vi homem
se vangloriar do corpo
como meu pai
de olhos fechados.

Possui conhecidos que não se incomodam,
simpatizantes e até seguidores.

Passeia pela ruas
à vontade.
Não se nota incômodo por onde passa.

Velhos pescadores noturnos,
quando meu pai passa,
tiram conclusões acerca do clima
e o aconselham sobre um possível resfriado.

Os bêbados do fim da rua
aguardam pontualmente sua chegada.
Imaginam se tratar de um anjo amoral
que dissemina a liberdade sem culpa.
Seguem fielmente seu anjo
até a volta pra casa.

As prostitutas do quarteirão de baixo
também esperam sua vinda.
Todas o cumprimentam
com enorme distinção nos lábios.

Quase se distanciando
ele retribui a gentileza.
Pisca levemente os olhos
e diz que volta sempre.

Retorna à casa, mas não ao quarto.

Segue em passos firmes
pelo corredor
e ao banheiro.
Deseja o frescor de um merecido banho.

Curiosamente tranca a porta
e fecha o vitrô.

Gosta do vapor que embaça o espelho
e de um pouco de intimidade.

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