Quando sabe-se menos.

A partir do momento em que a significação surge nas palavras de um texto, na exata precisão de ideia, nasce a sabedoria. A leitura, a elucidação e a compreensão provocam a emancipação da sabedoria alheia. Trata-se então da sabedoria íntima que se subtrai, uma concepção pessoal que acaba de ser preenchida por outro, uma possibilidade de vislumbre inédito que se anula, desaparece. Então, quando isso ocorre, estamos a saber menos do que o nosso egoísmo idealizou.



sábado, 8 de maio de 2010

A linda mulher que não (ex)tive

E ela me apareceu, desenhada num perfume que me elevava e me levava à um infinito pessoal. Seus olhos me fitavam como se eu pertencesse à última espécie humana, espécie como a de poetas gatunos ou trabalhadores esforçados. Tais olhos permaneciam como amêndoas, aguardando o linear da primavera, solitários casulos ainda verdes que esperam um último raio de sol para que, enfim, pudessem amadurecer. Seus cílios flutuavam em movimentos perspicazes, cambaleando cima-baixo como a brisa matinal, provida de além-mar.
Durante alguns segundos, o verde de seus olhos desejava lançar-se em alto-mar. Logo eu a seguiria. E assim ela mexia, fora o sentimento em contornos certos, concretos. Ela piscava, olhava e ria. Como ria!
Seus lábios assim disfarçavam, migravam vagarosamente ao pólo de seus rosto, sem enrosco, deslizava em sua superfície fina e de tonalidade outonal. Seu riso parecia perpetuar um horizonte fotográfico, de baías e Bossa Nova. Quantos suspiros almejaram-na? Quantos congelaram em sua morna fronte, em frente aos montes pecaminosos de seus lábios? E eu? Permaneço em foco.
Traços tristemente alinhados perpendicularmente aguardavam desatinamente a colisão de sentidos, a franqueza de agarrar com as mãos as estrelas da noite.
Dia-noite, eu observava lentamente o roseiral sensível de seu corpo. As cores brincavam de se espalhar, ora emudecendo pelas estações anuais de seu corpo, ora enrubescendo pela inconstância de movimentos. Girando diante de uma única alegre lágrima, que adentrava o rosado de suas maçãs, seus cabelos esvoaçavam, como se aguardassem um abraço, um retrato, ainda que fosse pitoresco.
E assim fixava-me, eternizava-me na sombra secreta de seus diários, refugos cenários de seriedade febril. E depois acordava, desejava-me bom dia, recolhia seus encantos e ia passear.

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