Quando sabe-se menos.

A partir do momento em que a significação surge nas palavras de um texto, na exata precisão de ideia, nasce a sabedoria. A leitura, a elucidação e a compreensão provocam a emancipação da sabedoria alheia. Trata-se então da sabedoria íntima que se subtrai, uma concepção pessoal que acaba de ser preenchida por outro, uma possibilidade de vislumbre inédito que se anula, desaparece. Então, quando isso ocorre, estamos a saber menos do que o nosso egoísmo idealizou.



terça-feira, 18 de maio de 2010

Digno adeus

As palavras que lhe serão ditas deveriam ter sido dispostas na noite de ontem, mas confesso que faltou à mim, coragem. Tinha de crer, primeiramente, na ausência de seus sentidos.
Nossos anos se passaram, enlaçados em mentiras, desejos e distância.
Fui parte de seu cheiro, motivo de suas blasfêmias e reencontros. Cheguei a cantarolar em sua memória e só não me portei como sua escrava porque nunca me foi permitido, nunca lhe fui digna de opção.
Mesmo nas noites em que lhe faltava um beijo estranho, um respiro de tranças novas, não havia de me procurar. Resignava-se na própria melancolia, dominando-se de saudosismo, literário ou cru.
Houve momentos de nossa história em que me rubria a face vê-lo triste. Sua quietude, assim, me transparecia confiança, me trazia um sentimento comum, um momento afável de conduta. Mas a breviedade de suas emoções logo me alertava aos motivos de meu amor.
Sem dúvida sempre soubemos de nossa vocação, nos completamos como pólos, tendo pontos em comum apenas no horizonte. Sentíamos figurações distintas de um mesmo plano, como se enxergássemos o avesso do outro reparado em versos (passagens contínuas e constantes).
As lágrimas que me enobrecem agora são delírios de agonia, são a vazão de um sentido inacabado.
Uma parte de mim se deflora, provocando distância às lembranças suas, aos desejos meus e às esperanças de outrora.
Percebo agora que seu rosto parece cansado, talvez minhas palavras estejam lhe envelhecendo, embalsamando sua pesada feição. Mesmo calado, pensativo, não faz questão de voltar os olhos à mim. Sabidamente minha linguagem nunca lhe proporcionou notável provocação.
No silêncio de nossos anos, na preocupação de tempo e espaço, buscava razões para partir, mas desde de os primeiros toques de seus dedos fui corrupta ao seu destino. Nem em gritarias triunfantes pude me afastar.
Já distante, minha juventude enfim se despede, migra para um ponto rijo de seu rosto opaco. Peço que a leve junto como um prêmio, que a castigue por determinados anos e que a enterre em seu coração junto ao meu.

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